terça-feira, 28 de abril de 2020

Notas de uma quarentena #2

Esta última semana foi dura.
Regressar ao blog deixou marcas. A culpa foi minha, que andei a reler algumas coisas - mas acho que era inevitável. Afinal este blog (e os outros que tive) conta um bocadinho da minha história. Não só pelo que escrevi propriamente e pelos fragmentos da minha vida que ficaram eternizados na blogosfera, mas também pelas pessoas que conheci através disto, o que elas trouxeram à minha vida e o que elas levaram da minha vida. 

Então, num primeiro momento, senti que voltar aqui não me fez bem. Porque revivi momentos marcantes. E... A blogosfera e este blog em particular estão para sempre ligados a um dos momentos mais difíceis da minha vida: eu estava a bloggar quando soube da morte do meu pai, há 5 anos... Hoje, com maior distância e frieza, vejo que foi isso que me afastou da blogosfera. A partir daquele dia, nada mais foi igual. Ainda tentei, ainda continuei aqui por uns meses, ainda cheguei a criar outros blogs, mas nunca mais consegui escrever com regularidade e com gosto por estas bandas. Foi como se aquele momento, aquela notícia, aquela perda, me tivesse retirado o gosto por estar aqui. Mesmo tendo tentado continuar, era-me penoso ler blogs - porque estava precisamente a "fazer a ronda" pelos blogs que seguia quando soube da notícia.

Mas, como bom viciado que fui nisto da blogosfera, nunca consegui deixar completamente o vício. Volta e meia batiam as saudades e fazia umas aparições.
Mas, bom, voltando ao que interessa...
Foi uma semana penosa, porque voltar aqui foi duro. Abriu feridas, abriu memórias, fez-me chorar. E ponderei muitoooo a continuidade de vir aqui desabafar ao longo da quarentena. But, well, numa altura em que não podemos fugir dos nossos fantasmas porque não temos como ir espairecer e etc, mais vale enfrentar e pegar o touro pelos cornos. Não estou aqui para ser blogger, como fui em tempos. Não estou aqui para ser regular na escrita. Estou aqui com o único propósito de ir deitando cá para fora todos os medos, preocupações, ansiedades e tristezas que me assolam neste momento estranho e atípico que o mundo vive... Escreverei quando me fizer sentido, enquanto me fizer sentido. Só para "botar conversa fora".

domingo, 19 de abril de 2020

Notas de uma quarentena #1

Poderia começar com um "então, pessoal, como vai essa quarentena?". Mas devo ser a única alminha por aqui, portanto vou-me escusar de fazer figuras ridículas - hoje já ninguém lê blogs, já ninguém escreve em blogs... E, por um lado, isso é bom para mim neste momento. É como voltar aos meus primórdios blogosféricos: não lia ninguém, ninguém me lia, e escrevia apenas para mim - e deixava as minhas memórias escritas e eternizadas, o que é fixe. Tem a sua piada reler coisas que escrevemos há não sei quantos anos, perceber o nosso crescimento e como vivenciámos as coisas por que passámos.

Já não escrevia há muito tempo. Não só aqui no blog: não escrevia de todo. Nos últimos meses, parece que fui perdendo a capacidade de o fazer. Mas preciso de o fazer agora.

Estou em casa há mais de um mês. Completamente em casa. Sem idas ao supermercado, sem "passeios higiénicos" (que raio de denominação), nada. Zero. Porque pertenço ao grupo de risco, dados os meus problemas cardíacos (inclusive tenho pacemaker). E estou a fritar a pipoca. Mesmo. O que já me levou a recorrer a aconselhamentos diversos, para ver se consigo manter a pouca sanidade mental que me resta. E foi precisamente aí que me sugeriram voltar a escrever. Mandar cá para fora tudo o que me aflige. Escrever é terapêutico, para mim sempre o foi, mas nos últimos tempos esqueci isso...

O filho da puta do Covid já me levou 2 coisas neste momento: a liberdade de viver em pleno, e o trabalho. Sou trabalhador independente há pouco mais de 1 ano... No início de 2019 decidi lutar pelo meu sonho mais antigo e decidi enveredar pela produção musical. Investi as minhas poupanças de mais de uma década de trabalho em prol de um sonho. Dei o salto mais arriscado da minha vida. Antes, trabalhava por conta de outrem e não estava nada mal na vida: não só estava efectivo como havia sido promovido há uns anos, e ganhava muito bem, umas boas centenas de euros acima do salário médio nacional. E gostava do que fazia! Mas fazer música sempre foi a minha grande paixão... Toco guitarra há tantos anos como sei ler e escrever, integrei várias bandas, fazer música sempre me foi tão natural e imprescindível como respirar. Em 2016, comecei a pensar mais a sério na música, e o bichinho maior era o da produção. O que eu gosto mesmo é de criar música - embora o palco dê uma adrenalina inexplicável, mas para mim a verdadeira magia é o "behind the scenes". Isso é que faz os meus olhos brilharem! E fui preparando terreno para fazer a maior loucura da minha vida: despedir-me e lançar-me sozinho às feras. Investi milhares de euros em equipamentos, em instrumentos, em espaço, em tudo o que era necessário. E assim nasceu o meu estúdio.

E nisto veio o Covid-19... Devido a ser cardíaco (e já tive sustos suficientes na vida para ter a noção que, se o bicho me pega, dificilmente o meu coração aguenta uma insuficiência respiratória), ainda antes do estado de emergência e do fecho das escolas, já eu tinha decidido fazer uma quarentena profilática. Mas ainda havia pouquíssimos casos em Portugal, e zero casos onde vivo! E portanto acho que não tinha, no início, a real noção do que isto seria. Pensei "ok, 2 ou 3 ou 4 semanas em casa... e depois tudo voltará à normalidade". Ingenuidade minha, claro... Claramente estava em negação... É óbvio que um vírus altamente contagioso e potencialmente letal para pessoas como eu não desaparecia em semanas...

E, 5 semanas depois, aqui estou eu... Completamente recolhido em casa, sem qualquer saída registada nestas 5 semanas. Conto com a imprescindível e incansável ajuda dos colegas de casa para compras - e eles têm sido impecáveis, tendo todos os cuidados quando chegam a casa. Acho que ainda têm mais medo do que eu - e olhem que eu tenho muito.

Admito, sem vergonha nenhuma, que estou borrado de medo. E que estou completamente na merda. Sou de risco, estou fechado em casa, estou longe da família, duas das pessoas que mais amo na vida são igualmente de risco, e estou sem trabalho por tempo indeterminado... Morro de medo por mim, pela minha saúde, mas também pelos meus. O Covid já me levou o trabalho e a liberdade, e morro de medo que me leve também alguém... E estar sem trabalho está a fritar-me completamente... Não sei como vou sobreviver nos próximos meses, não vou conseguir fazer face a todas as minhas responsabilidades... Vou estar com a corda na garganta durante muito tempo - e provavelmente vou ter que mandar o sonho com o caralho, porque o romantismo tem que ser substituído pelo pragmatismo...

De modos que é isto... E não só, mas o resto agora, para o caso, não interessa... Estou absolutamente na merda, profissional e pessoalmente. E morro de medo da merda do vírus... Morro de medo que o bicho me leve ou a algum dos meus... Têm sido muitas as lágrimas nas últimas semanas... Lágrimas de medo, lágrimas de desespero, lágrimas de indefinição...

Não sei muito bem o que hei-de fazer à minha vida... Nem tenho forma de saber, e é essa incerteza que me consome! Não sei quando tudo isto irá passar, ninguém sabe! E, para alguém que sofre de ansiedade, a incerteza também mata...

(não sei se vou ganhar o hábito de voltar aqui regularmente, talvez o faça... pode ser que ajude, mandar tudo cá para fora...)
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