Cheguei a iniciar mais um post sobre a polémica do ano: a praxe. Mas como já tenho lido e ouvido tanta coisa sobre o assunto, já me cansei um bocadinho de andar às voltas. Porque os chamados anti-praxe são tão convictos que a praxe é uma coisa má e violenta always and forever, que fazem puros ouvidos de mercador a exemplos de praxes positivas, de praxes divertidas, de praxes solidárias. Pelo que desisti de utilizar palavras minhas, porque é escusado. Mas como sou pela praxe, pela tradição, pelo espírito académico e por Coimbra, vou utilizar as palavras de outros para continuar a defender as causas em que acredito e para continuar a mostrar que há coisas tão ou mais graves que as pessoas aplaudem... Mas keep calm, que criticar praxe é que é da "çena".
"MAIS UM EPISÓDIO DA “PRAXE”, OU NÃO…
O episódio que a seguir vou relatar ocorreu recentemente,
perante os meus olhos incrédulos, sem que eu pudesse fazer alguma coisa para o
contrariar:
Era Inverno. Lá fora, próximo da meia-noite, o frio era
óbvio, sendo que as temperaturas deviam rondar os 9ºC. Já tinha, inclusive,
chovido bastante.
Dentro de casa, três indivíduos (1 rapaz e 2 raparigas),
expectantes e nervosos, estavam perante o dilema de saber que aquela poderia
ser a sua última noite naquele local.
De súbito, imperiosa, ouve-se uma voz que, sem apelo, nem
agravo, lhes coloca o seguinte desafio: Mergulhar numa piscina e retirar todas
as bolas que se encontravam no seu fundo, tudo num curto espaço de tempo.
Aquele que encontrasse a bola premiada seria contemplado com a possibilidade de
continuar e, quiçá, ser o grande vencedor, os outros dois seriam castigados com
a sua expulsão.
Sem hesitar, os três indivíduos levantam-se, despem todas as
suas roupas, ficando apenas de soutien e cuecas e saem para o exterior,
alinhando junto à borda duma piscina.
A tremer, de frio e de nervosismo, uma das candidatas resolve
desistir. Não tem coragem, não se quer atirar para dentro da água gelada. Recua
e, em lágrimas, veste um roupão.
Rapidamente e autoritariamente, a tal voz volta a surgir e,
sem mostrar a cara, insiste para que a candidata continue na prova.
A candidata chora, mas face às insistências e com o nervoso
do desconhecido, volta a despir-se e a alinhar junto à piscina.
À contagem daquela voz, os três candidatos lançam-se em
mergulho na piscina para cumprirem a prova. Passado cerca de um longo e gélido
minuto, os candidatos saem da água enregelados, sendo que um deles (uma das
raparigas) não tinha ainda completado a prova. Face a essa evidência a voz
volta a ordenar que se atire novamente para aquela água e que complete a sua
prova.
A tremer de frio e de olhar vago e perdido, a candidata volta
a mergulhar e a muito custo consegue terminar a prova, sendo retirada da água
com a ajuda dos seus colegas.
A prova termina. Uma candidata vence. Os outros dois são
expulsos naquela mesma noite.
Não, isto não se passou numa sessão de Praxe.
Isto ocorreu na terça-feira à noite, em direto, num programa
do canal aberto TVI, perante cerca de um milhão de telespetadores. Os
candidatos eram concorrentes de um programa chamado “Casa dos Segredos –
Desafio Final 2”.
Contaram-me que recentemente, nesse mesmo programa, os
concorrentes foram sujeitos a, de olhos vendados, colocarem a mão num
recipiente cheio de baratas, bem como, a comerem um prato cheio de
grilos/gafanhotos fritos. Tudo sob pena de serem expulsos de um programa de
televisão e em troca de mais uns minutos de fama.
Infelizmente, sobre isto a TVI não perdeu um único minuto do
seu jornal da noite a comentar as atrocidades destas práticas televisivas, nem
submeteu a debate juízes, professores e dirigentes associativos.
Como é que se pode compreender que um canal de televisão
tenha a audácia de, em menos de 30 minutos, discorrer tudo sobre os “males” e
“violências” da Praxe e, ao mesmo tempo, seja ela própria capaz de, nos seus
programas, sujeitar os seus concorrentes a práticas que nem o mais vil dos
praxistas seria capaz de se lembrar.
Esta é a televisão que temos e é bom que, neste e noutros
temas, sejamos capazes de saber separar o trigo do joio, a informação da
charlatice e a seriedade da ignorância."